terça-feira, 12 de agosto de 2008

O viajante do tempo


Amanheceu. Mais um dia perdido no tempo. Tudo bem, já estou me acostumando a acordar um dia no passado, outro no futuro. Às vezes dou sorte de acordar no presente, ao lado de uma linda mulher, ouvindo os gritos de duas crianças que me vêm me beijar. Gosto de acordar assim, pai e marido, comida na mesa, sábado de sol. Gosto de viver o tempo de uma forma normal. Mas fui escolhido para ser um viajante do tempo. Não me pergunte como. Não me pergunte por quê. Não, eu não escolhi isso. Se eu gosto? Eu preferia ser normal. Mas já estou me acostumando, como com tudo nessa vida. As coisas nunca são iguais, mas já cheguei a ver o mesmo pôr-de-sol várias vezes. Tem dia que eu acordo velho, e, no seguinte, menino travesso. Passo dos oitenta aos oito da noite para o dia, literalmente. E acordar recém-nascido é, realmente, muito estranho. Já renasci muitas vezes, e já estive à beira da morte. Mas nunca morri. Eu não tenho idade fixa, nem planos. Tenho medo de dormir e ver o que me aguarda do outro lado da linha do tempo. É como se ela fosse um novelo, uma trama confusa e emaranhada. Minha vida não segue linha reta. É sinuosa e cheia de surpresas. E eu tenho medo, muito medo. Já passei noites em claro, para poder viver mais um pouco a mesma vida. Já cheguei a passar cinco dias acordado, curtir minha família, trabalhar e viver uma rotina. Mas chegava uma hora em que eu caía prostrado de sono. Minha sina já estava delineada ali, e não havia nada que eu pudesse fazer. As pessoas não percebem. Embora cada dia eu acorde numa época diferente da minha vida, as pessoas são sempre as mesmas. Meus filhos me contam de como eu fui bem no futebol de ontem, mesmo que eu só vá viver esse momento no futuro, minha esposa me agradece as flores que eu mandei para o trabalho dela. E o sorriso das pessoas que amo me conforta, e me ajuda a resignar-me. Mas descobri que, seguindo o curso aleatório da minha vida, eu sofreria menos. Afinal, eu estava me apegando demais às pessoas que fazem parte da minha vida, e à rotina a qual eu estava me submetendo. E dói mais que uma facada saber que não posso fazer planos de futuro. Eu vivo futuro, passado e presente o tempo todo! E o que mais me dói é saber que poucas vezes eu vou acordar ao lado da mulher que eu amo, e que terei que abrir mão dos sonhos mais banais. E eu sigo errando, tentando me aceitar como sou, ainda que me perca para sempre no tempo.

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