sábado, 12 de julho de 2008

Diário do futuro (parte II)

Paramares, 38 de oytocjnjka de 2079

Oi, acabei de voltar da Babuska, a nossa terceira lua. Lá tem uma praia lunar gelada incrível! É lá que patinamos no gelo e fazemos esculturas de areia azul. Depois, fomos comer fantz (por favor, não me pergunte o que é!).

Por incrível que pareça, em Alpha há vegetação. No Antigo Mundo, achava-se que vegetação fosse algo exclusivamente terrestre, mas não é. Só que os vegetais são bem diferentes, mas possibilitam uma dieta rica em cálcio e selênio, além de fazer com que a agricultura seja a principal atividade do nosso planeta. Comemos muitas folhas azuis, como napoons e wjnks, além de raízes e frutas, como trokz, greenberries, glasnitz e applegrapes.

Quer conhecer meu cachorro? Quer dizer, não é bem um cachorro... é um bicho que tem aqui que se parece com um, apesar de ter três olhos e ser bípede, mas nós chamamos de cachorros, mesmo. O nome dele é Walley. Ele caça paracercárias como ninguém! Além disso, afugenta os insetos e as cucarachas. O problema é que, quando ele vê uma estrela cadente, ele acaba correndo atrás. Uma vez, ele quase saiu de Uir por causa de uma! Mas é só oferecer a ele um pedaço de pão de red weat com geléia de applegrapes, que ele se esquece da estrela.

Mamãe adora cozinhar. Ninguém mais vive de pílulas e comidas a vácuo desde que chegamos em Alpha 23. Água quente para cozinhar legumes é muito fácil de encontrar: aqui há vários gêiseres, e sempre há algum em ebulição. Só temos que tomar cuidado para não explodirem na nossa cara!

Papai é agricultor, como a maioria das pessoas aqui. Ele criou um projeto de engenharia agrícola que melhorou muito a colheita por aqui. Ninguém aqui trabalha por dinheiro; aliás, dinheiro não existe. Meu pai contou que dinheiro eram cédulas de papel que provocavam efeitos alucinógenos, podendo levar à destruição e à morte. Essa palavra aqui é palavrão, e eu bato na boca cada vez que eu falo. Foi por causa desse maldito dinheiro que a Terra foi destruída. Não era suficiente para as pessoas no Antigo Mundo encher a barriga e ser feliz simplesmente. Elas precisavam de mais e mais, e, por incrível que pareça, nunca estavam contentes. Por isso, aqui não existe dinheiro; a subsistência nos basta.

E assim a gente vai vivendo. Outro mundo, outro planeta. Deus deu pra gente uma chance de recomeçar; por isso só agora descobrimos Alpha 23. Queremos fazer de Alpha um lugar muito diferente do que foi a Terra, onde as plantas possam ter dignidade e os animais sejam admirados vivos. Onde o homem cuide das estrelas e da própria gravidade, preservando o ar e limpando os céus. Mesmo que eu não tenha conhecido a Terra, sei que não gostaria de viver no caos que ela estava. Eu até escuto o Universo às vezes, um som propagado no vácuo, coisas impossíveis e bolhas de ar. E tudo o que eu ouço é o som de uma nova chance, de uma esperança que sorri e diz: "Bem vindos à existência".

Acho que não tenho mais o que escrever. Eu sou só uma criança, ainda tenho muitas luas para viver. A existência está recomeçando. E eu vou ousar existir, para fazer tudo diferente dos meus antepassados. Um dia talvez eu volte, e escreva mais sobre o meu planeta.

Jacya-bye,

Harbie

2 comentários:

Gauche disse...

Você escreve muito bem, menina! Uma escrita leve, delicada, mas que cutuca os pontos que, a meu ver, são os mais importantes.

"Foi por causa desse maldito dinheiro que a Terra foi destruída".

Ter consciência dos fatos é a melhor das infelicidades, se é que me entende.

Aplausos!

Marcelo disse...

Devo dizer que a primeira parte foi de uma criatividade fora do comum, entretanto, na parte 2, a criatividade é utilizada para explorar um pouco mais sobre as questões que levaram à extinção da Tera. Apesar da crítica ao capitalismo/neoliberalismo estar evidente, foi de extrema felicidade, não sei se intencional, criticar o comunismo que muito tem sido difundido como forma de combater o capitalismo e seu consumismo desequilibrado. As idéias comunistas são extremamente interessantes, o próprio marxismo, mas são idéias que não buscaram ser renovadas através do tempo, o que tende a se transformar num dogma. Será que estamos preparados pra viver num mundo comunista? Interessante tb o final, já em tom existencialista. Enfim, creio que há espaço pra várias continuações, justamente agora que está ficando interessante, hehe